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Revendo as contas

Para quem não viu, o caderno de Economia do Estadão publicou ontem uma reportagem - especialmente pelo prisma do custo de vida - sobre os preços de restaurantes em São Paulo. A constatação: paga-se mais caro aqui do que nos EUA e na Europa. Este blog, como vocês, sabem, vem tratando do tema já faz tempo. Contribuí, inclusive, com um boxe de análise. Aqui, o texto de abertura; neste outro, alguns números do setor. Já neste link, tem opinião até de Alain Ducasse sobre nossos preços. E depoimentos de quem conhece Pequim e Beirute. A conclusão sobre o assunto? Não temos. E há várias maneiras de abordá-lo. Vou elencar algumas opiniões, dessas gerais: "Em São Paulo, tudo está caro. Aluguel, mão-de-obra, serviços, insumos... Não dá para fazer mágica." "Os salões estão cheios? Então, o público está achando normal. Ou ao menos, o pessoal está podendo pagar. Não seria natural os empreendedores baixarem os preços." "Quem determina o que é caro ou não é o mercado. Somos um país de economia aquecida. Portanto, tudo sobe..." "As margens de lucro, no Brasil, parecem maiores do que no exterior. Os restaurateurs, no entanto, afirmam que estão ganhando pouco." "O volume de faturamento de 2010, entre os restaurantes, foi recorde." Contudo, ainda que não cheguemos a um veredito, precisamos refletir a respeito. Não podemos achar normal pagar R$ 100, R$ 150, por uma refeição corriqueira. No texto que escrevi para a Economia, termino recomendando que as pessoas (quem tiver condições e oportunidade, claro) comam no exterior. E comparem. E tenham a noção do que está acontecendo aqui. Meu ponto central é mais do que o preço, é o valor; é aquilo que recebemos em troca. Para muita gente, é difícil entender este aspecto: vão falar que eu desconheço finanças, que estou por fora, que nada sei das despesas com matéria-prima, dos impostos, das taxas em cascata etc. Não, não, por favor. Prestem atenção. Se não há como mexer nos preços, se os clientes estão pagando o que é pedido, não serei eu, aqui, a determinar que um prato de R$ 60 deveria custar R$ 40. Mas eu posso garantir que não temos a contrapartida por aquilo que pagamos. Alta cozinha? É cara, de fato. Muitas vezes, abusiva, com notáveis exageros (nossa elite da restauração cobra no patamar do mundo "três estrelas Michelin"). Mas o luxo sempre terá preços elevados. Se você tem um monte de funcionários, usa iguarias, investe em pompa... não há milagre a ser feito. Eu olho em volta e, ao menos, consigo intuir para onde foi meu dinheiro. Não estou isentando esta classe de restaurante. Mas ali - como num boteco, de um jeito diametralmente diferente -, a regra do jogo é mais clara. Porém, minha principal crítica é sempre em relação a um expressivo contingente da chamada média restauração. Que não tem custos de criação e pesquisa (a maioria usa receitas de domínio público). Não tem grandes qualidades de produto (usa a matéria-prima corrente). Não tem muita identidade. Mas, usando pseudo-luxos e fazendo brilhar o "ouro de tolo", cobra como se fosse alta gastronomia. E, à mesa, nos põe comida que, com sorte, é só boazinha. Porém, cobrando preços irreais. Por analogia ao que afirmei logo acima, eu já não consigo intuir para onde foi meu dinheiro... Eu defendo um cenário gastronômico com diversidade, do simples ao sofisticado, passando pelo médio em seus muitos gradientes. Mas torço para que nosso amadurecimento não seja apenas no business. Seja principalmente na cozinha. Eu tenho escrito que não quero o barato, simplesmente. Quero o bom. Pois comer mal é sempre caro, independentemente de quanto se paga. A imprensa tem um papel nesse contexto? Claro. Especialistas, profissionais também? É óbvio. Mas a real possibilidade de estabelecer um equilíbrio está nas mãos dos frequentadores. Eles é que determinam onde apostam seus suados reais. Sem vilanizações nem raciocínios simplistas, eu peço que as pessoas cuidem bem de seu dinheiro. Se é para pagar uma conta alta, então sejam exigentes, clamem por qualidade. E não façam fila em restaurantes que não sejam realmente satisfatórios, por modismos ou por inércia de comportamento. Consumo consciente, enfim. Em síntese, as contas dos estabelecimentos daqui já são maiores do que no dito primeiro mundo. Se elas valem, isso cabe a nós, clientes, decidir. A minha opinião está aqui. Acabei me estendendo demais. O que eu queria é que vocês vissem o material publicado no Estadão de domingo. Está lá alto, é só clicar nas palavras em negrito.

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