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Bebida

Agruras de um growler

– Oi, você pode completar com chope para viagem, por favor?

Agruras de um growlerFoto:

– Completar o quê?

Pobre growler. Famoso nos séculos 19 e início do 20 nos EUA como meio de transporte de chope dos bares até as casas de família, o recipiente – à época metálico – caiu em desuso por muitas décadas. Voltou, há alguns anos, a conquistar fãs em microcervejarias e bares norte-americanos. No Brasil, apesar de alguns locais já disporem dos vasilhames, o pedido acima ainda é bastante incomum.

Embora esteja a anos-luz de causar o mesmo impacto social do primeiro biquíni, nos anos 1940, ou da saia de Flávio de Carvalho, nos 50, o hábito cervejeiro ainda é visto com estranheza na capital. Depois de entenderem as intenções do portador do growler, alguns atendentes ainda sugerem, condescendentes: “Mas o senhor não prefere tomar os chopes aqui mesmo?”

FOTO: Roberto Fonseca/Estadão

O convite tem uma razão: o preço, talvez o maior obstáculo para que a moda dos growlers pegue no Brasil. Na cidade de São Paulo, os locais que consultei e que aceitam encher os recipientes para viagem cobram o equivalente aos chopes servidos em copo, in loco. No Empório Alto dos Pinheiros, por exemplo, encher um growler de 1,8 litro com a bohemian pilsner Camilla, Camilla sai por R$ 36, ou o mesmo que quatro chopes de 500 ml. Na loja da microcervejaria, o litro do chope – vendido só em barris – sai R$ 7,60. A conta é mais interessante na comparação com as garrafas de 600 ml da mesma receita, que saem por R$ 15 cada no Empório. Para atingir o volume do growler, é preciso gastar R$ 45.

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Outros bares que enchem growlers, como o Rothko e o The Joy, seguem a mesma tabela de preços. A Cervejaria Nacional, que produz as próprias fermentadas, dá um desconto: qualquer chope no growler de 1,8 litro sai por R$ 39. Tomar o equivalente em copos no bar da fábrica custaria R$ 44,70.

FOTOS: Filipe Araújo/Estadão

O aumento do uso dos growlers passa diretamente pela vantagem financeira. Há diferentes vasilhames que podem ser usados; os preços vão de R$ 30 (o da Rogue, vazio) a mais de R$ 100 (da Christoffel, cheio).

A principal vantagem do growler é permitir o consumo, em casa, do chope fresco, sem a necessidade de chopeira, barril, gelo e quetais. No caso da Camilla, Camilla, é nítida a presença mais destacada de lúpulo do que na versão em garrafa, pasteurizada. Em outro teste, com a IPA Mula, da Nacional, a lupulagem também se manteve intensa. Mas um dos efeitos perceptíveis do uso do sistema é a perda de gás – em especial depois de aberto o recipiente pela primeira vez. Os locais que usam o sistema em São Paulo fazem o enchimento direto da chopeira, sem isolamento.

O mestre-cervejeiro Paulo Schiaveto alerta, também, para o risco de contaminação, que pode trazer aromas e sabores indesejados e até supercarbonatar o chope, aumentando a pressão interna no growler. Ele defende que a higienização dos recipientes deva ser feita pelas cervejarias ou pontos de venda, e que o melhor método de limpeza é com pouco detergente neutro, escovas e enxágue abundante. O risco de oxidação, diz, é menor, pois o giro da bebida é rápido e ela deve ser mantida refrigerada.

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Além do frescor, outra vantagem do growler é poder levar para casa receitas que só são vendidas em chope. O apelo ambiental também é forte: a cada reuso do vasilhame, deixa-se de consumir garrafas não retornáveis. E há um viés saudosista, em especial para quem levava cascos de cerveja vazios ao mercado para troca por outros cheios.

>> Veja todos os textos publicados na edição de 22/11/12 do ‘Paladar’

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