PUBLICIDADE

Bebida

Entre o Etna e o mar, um vinho branco com grande potencial

O leste da Sicília é dominado por vinhos tintos. No entanto, os brancos, feitos principalmente com a uva Carricante, são os que merecem mais atenção

O cenário das vinícolas da região é marcado por rochas formadas a partir da lava do vulcão Etna. Nesta foto, as pedras são resultado da erupção de 1981. Foto: Alfonso M. Cevola|NYTFoto: Alfonso M. Cevola|NYT

The New York Times  De Milo, Sicília

A primeira coisa que você percebe na nova vinícola Aeris, de Salvo Foti, no sopé do Monte Etna, na Sicília, é a porosidade do solo. Em partes dos cerca de seis hectares plantados, onde as jovem parreiras de Carricantes são condicionadas a crescer verticalmente em estacas de castanheira, no antigo estilo alberello, o solo parece engolir o pé que pisar com mais força na terra. A segunda coisa são os terraços de pedra meticulosamente construídos em uma encosta e as valas de drenagem feitas de pedra, destinados a diminuir o fluxo de água e a evitar a erosão.

O cenário das vinícolas da região é marcado por rochas formadas a partir da lava do vulcão Etna. Nesta foto, as pedras são resultado da erupção de 1981. Foto: Alfonso M. Cevola|NYT

A chuva é frequente na região de Milo, uma cidade na face leste do Monte Etna, vulcão hiperativo que hoje tem a fama de ser uma fonte de excelentes tintos, feitos principalmente com a uva Nerello Mascalese.

Mas Milo é diferente das outras áreas vinícolas da região: o grande volume de chuva faz dela o território do vinho branco, um lar acolhedor para a uva Carricante em particular. "A Carricante nasceu em Milo", disse Foti. E mesmo os burocratas reguladores reconheceram a afinidade da região com a melhor uva branca da Sicília: o Etna Bianco, feito com um mínimo de 60% dessa uva, pode ser produzido em todas as regiões vinícolas da área, mas o Etna Bianco Superiore, com maior nível de qualidade e com no mínimo 80% de Carricante, vem apenas de Milo. Se você nunca ouviu falar da Carricante e se pensa que o Etna somente produz tintos, sem dúvida não está sozinho; o leste da Sicília é dominado por vinhos tintos. No entanto, os brancos, feitos principalmente, se não inteiramente, com a Carricante, podem ser ainda mais distintos. Os melhores, como o Pietra Marina, da Benanti, são profundamente saborosos, marcadamente salinos. Resumindo em uma palavra: salgados.

PUBLICIDADE

Salvino Benanti Foto: Alfonso M. Cevola|NYT

O maior problema dos Carricantes é que poucos são bons, fato enraizado na cultura e na história.

"A Sicília é a terra dos tintos, não dos brancos", disse Foti enquanto caminhávamos por seu vinhedo. Até os anos 1980, a maioria do vinho produzido na região do Etna era de tintos baratos, vendidos a granel. A maior parte era exportada. "A ideia era fazer vinho barato e forte para vender para outros lugares e a Nerello Mascalese servia perfeitamente para isso. A Carricante era ignorada, e ainda é, por muita gente", disse Salvino Benanti, que, com seu irmão gêmeo, Antonio, dirige a Benanti. No oeste da Sicília, que produz vinho branco em quantidades muito maiores, o domínio é da Catarratto Bianco, que produz um vinho suave e pouco ácido. A Grillo e a Inzolia fazem vinhos brancos muito bons, mas, como diz Foti, são basicamente usadas no Marsala, um vinho doce. Da mesma forma, há a Moscato, empregada principalmente no vinho doce passito.

A vinícola Aeris, de Salvo Foti, se esforça para tornar a uva Carricante mais conhecida. Foto: Alfonso M. Cevola|NYT

Pietra Marina pode ser a principal expressão do Etna Bianco Superiore, mas outros Carricantes com estilos diferentes valem uma busca, começando com o básico Biancodicaselle Etna Bianco, da Benanti, que usa a Carricante da Contrada Caselle, em Milo, e do sudeste do Etna. Não é tão rico, profundo ou complexo quanto o Pietra Marina, mas é delicioso de certa forma, e costuma ser mais barato. Tenuta delle Terre Nere, perto de Randazzo, no norte da Etna, uma das maiores produtoras de Etna Bianco, faz dois exemplares: o Bianco, com maior produção, é uma mistura de cerca de 65% de Carricante e de quatro outras uvas. Seu gosto mais marcante é o de ervas e frutas cítricas, e é bem refrescante; o outro Bianco, o Cuvée delle Vigne Niche (trazido para o Brasil pela Mistral), leva somente a Carricante e é muito mais saboroso e salino.

PUBLICIDADE

Alberto Aiello Graci Foto: Alfonso M. Cevola|NYT

Alberto Aiello Graci, também no norte do Etna, faz dois Biancos. O vinho de nível básico, com 70% de Carricante, é agradável e refrescante, mas o que leva apenas essa uva, o Arcurìa, é excelente, herbáceo, mineral e salino. Ciro Biondi, cujos vinhedos estão na região sudeste mais quente do Etna, também faz dois Biancos, mas nenhum é 100%: o Outis básico é fresco e energético, levemente salgado, com sabores de ervas e limão; o Chianta Bianco 2014, de um único vinhedo, é deliciosamente floral, como o perfume de uma cesta de flores. A Barone di Villagrande, pioneira da Carricante como a Benanti, faz um Etna Bianco Superiore muito bom, embora sem as dimensões do Pietra Marina. Restam agora os vinhos de Foti, que teve grande destaque para o sucesso da Carricante. Além de trabalhar com a Benanti até 2011, ele se consultava com Biondi e fez um dos poucos Carricantes fora da região do Etna, com a Gulfi, localizada perto de Vittoria, no sudeste da Sicília. (É mais rico e menos distinto do que as versões do Etna). Seu Etna Bianco Superiore, chamado Vigna di Milo sob o rótulo I Vignieri, é excelente. O de 2014 era fresco, floral e quase oceânico, com grande mineralidade e salinidade.

Salvo Foti, da vinícola Aeris. Foto: Alfonso M. Cevola|NYT

Através de seu trabalho com Benanti e outros, Foti divulga a Carricante – e um dos convertidos é Kevin Harvey da Rhys Vineyards, nas Montanhas Santa Cruz, na Califórnia que, há cerca de 10 anos, durante uma viagem pela Itália, provou o Pietra Marina de 2001. "Fez-se a luz para mim. Ele tinha todos os aspectos de um grande vinho branco: bem envelhecido, complexo, integral. Acho que a Carricante é uma das melhores uvas brancas do mundo", disse.

PUBLICIDADE

PUBLICIDADE