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Comida

A Bahia faz chocolate

Produtores de cacau da região sul do Estado deixam de ser apenas fornecedores de matéria-prima para a grande indústria e agora estampam seus nomes em rótulos artesanais produzidos com cacau de qualidade

A Bahia dos chocolates. Novas marcas como Isidoro, Amado Cacau, Fazenda Jupará, Chor, Var, e outras se juntam às pioneiras Amma, Mendoá e Sagarana. Foto: Alex Silva|EstadãoFoto: Alex Silva|Estadão

De Ilhéus

A terra do cacau está se transformando: o sul da Bahia é hoje a terra do chocolate. A região que por muitos anos teve tradição na produção de cacau para uso industrial, mais voltada à quantidade que à qualidade, produz atualmente mais de 30 marcas de chocolates de origem, entre eles os que ilustram esta página. Amma e Mendoá talvez você já conheça. Pioneiras no mercado de chocolate fino da região, podem ser encontradas nos grandes mercados do País e também no exterior. Já nomes como Amado, Isidoro, Mestiço, Modaka, Choc, Var, Maltez e Maia estão chegando ao mercado, cheios de qualidade para exibir.

Quase três décadas após a devastação das lavouras pela vassoura-de-bruxa – praga que assolou a região no final da década de 1980 e levou fazendas e famílias inteiras à falência –, os produtores de cacau, de olho no mercado crescente do chocolate gourmet, têm se dedicado ao cultivo do cacau selecionado (o chamado cacau fino) e à produção do próprio chocolate.

A Bahia dos chocolates. Novas marcas como Isidoro, Amado Cacau, Fazenda Jupará, Chor, Var, e outras se juntam às pioneiras Amma, Mendoá e Sagarana Foto: Alex Silva|Estadão

A ideia é ter qualidade para conquistar mercado, um grande passo para um setor que tradicionalmente era marcado pela dependência das grandes indústrias.

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Não param de surgir novas marcas na região. Em 2013, havia apenas três nomes no mercado, conforme matéria publicada pelo Paladar, na época. Hoje, são pelo menos 30 – como constatamos durante a última edição do Festival Internacional do Chocolate e do Cacau, realizado em Ilhéus, em julho. Houve um recorde de novas marcas apresentando suas barras no evento.

Leia também: Netos dos coronéis do cacau voltam às fazendas para fazer chocolate

Chocolate do sul da Bahia já é feito com amêndoas de cacau de qualidade, plantadas, colhidas e fermentadas, com atenção à cada etapa e transformadas em barra. O conceito do chocolate feito desde a amêndoa até a barra pelo mesmo produtor, from bean-to-bar, que virou sinônimo de qualidade em todo o mundo, já foi ultrapassado pelo sul da Bahia, onde a ordem agora é produzir o chocolate from tree-to-bar, quer dizer, desde a árvore. Ou seja: produzir o cacau e fazer o chocolate, muitas vezes dentro da própria fazenda. É um privilégio de poucos lugares no mundo.

Antes apenas exportadora de cacau, agora a Bahia também trabalha a matéria-prima Foto: Alex Silva|Estadão

Cheios de personalidade, cultivados sob normas de manejo sustentável, com alto teor de cacau e com características do terroir presentes no produto final, os chocolates do sul da Bahia buscam conquistar a certificação de Indicação Geográfica para garantir sua proteção e valorização. A partir disso, a Bahia quer se consolidar como uma região produtora de chocolate de origem no País.

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Tree-to-bar

O tree-to-bar (da árvore à barra) é um conceito que define chocolates produzidos pelo mesmo fabricante, desde o cultivo do cacau nas fazendas até a barra de chocolate. É uma espécie de evolução do bean-to-bar, termo que já tomou conta do mercado de chocolates do mundo todo ao se referir a barras produzidas por um mesmo “chocolate maker” da amêndoa à barra e que, antes de enorme popularização, era sinônimo de um chocolate artesanal e de qualidade superior. Estampar na embalagem o termo tree-to-bar é um conceito relativamente novo. Afinal, é comum que a plantação de cacau e a fabricação de chocolates ocorram em países diferentes. Lugares com grande tradição chocolateira, como Suíça e Bélgica, não têm sequer um cacaueiro plantado. O Brasil, assim como a Venezuela e o Peru, está mudando essa história. Segundo os produtores, a grande vantagem do conceito tree-to-bar é o controle sobre todas as etapas de produção do cacau, desde o cacaueiro até a secagem da amêndoa – o que é essencial para se fazer um chocolate de qualidade.

Cacaueiro, árvore onde todo o processo de produção de chocolate começa Foto: Ana Lee

Aliados na trajetória

No novo contexto que o sul da Bahia vive hoje – de valorização do cacau de qualidade –, há aliados que auxiliam os produtores a se inserirem no mercado tanto nacional quanto internacional, servindo como ponte entre eles e os consumidores do cacau e do chocolate fino. Um deles é o Centro de Inovação do Cacau (CIC), que foi inaugurado no início deste ano em Ilhéus e tem como principal função atestar a qualidade e certificar o cacau produzido na região. Trata-se de um laboratório de alta tecnologia que faz análises de amêndoas de cacau. Produtores mandam seu material para ser examinado e, a partir do laudo que recebem, dão preço ao cacau, de acordo com a qualidade da amêndoa.

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Centro de Inovação do Cacau certifica a qualidades das amêndoas Foto: Ana Lee

Quem também age nessa frente é a Dengo, marca de chocolate lançada em junho, que utiliza o cacau fino da região. A Dengo não tem fazendas. Ela compra cacau de produtores selecionados e paga um prêmio a eles conforme a qualidade de suas amêndoas. Para atestar a qualidade, a empresa utiliza o CIC e, a partir do resultado, a Dengo fixa o preço que será pago por elas. “Já chegamos a pagar um prêmio de 70% do valor do cacau na bolsa por um cacau da região”, conta Estevan Sartorelli, fundador da marca. Hoje, a Dengo tem em sua linha 12 produtores. Mas já são mais de 80 interessados em entrar na lista. Além de comprar, a Dengo também os auxilia na capacitação de mão de obra e na melhoria da lavoura.

Não basta fazer chocolate, tem que fazer chocolate bom

Chocolate feito da amêndoa à barra ou da árvore à barra, artesanal e com cacau de origem, não é necessariamente sinônimo de chocolate de qualidade. Não há dúvida de que este movimento que ocorre no sul da Bahia, mas também em todo o Brasil, é positivo. O País saiu do campo da commodity para entrar no campo do produto final, que tem muito mais valor no mercado e pode colocar o Brasil em um novo patamar internacional. Mas ainda há um longo caminho a percorrer, conforme explica a chocolateira Paula Carvalho, da Alquimia Chocolates, que levou medalha de ouro no primeiro Prêmio Bean-to-Bar. Ela estuda e trabalha com chocolate há mais de dez anos, já experimentou barras bean-to-bar americanas e europeias e não tem dúvida de que o Brasil está na curva de aprendizagem quando se trata do chocolate fino nacional. “O mais importante agora é entendermos que não basta conseguir fazer o chocolate, devemos estudar, nos especializar, provar o que está sendo feito lá fora, buscar referências nos mercados já consolidados, enfim, criar referência do que é bom para se tornar bom.”

Brasil busca deixar estigma de ser somente um exportador de cacau para trás Foto: Alex Silva|Estadão

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*VIAGEM A CONVITE DA CHOCOLAT BAHIA 2017

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