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Pela primeira vez, uma mulher é a vencedora do Bocuse D’Or Brasil

Pela primeira vez, uma mulher é a vencedora do Bocuse D’Or BrasilFoto:

Parecia um show de calouros com um quê de gincana universitária. Música altíssima, o apresentador agitando a plateia com microfone sempre em punho, candidatos suando contra o tempo e gritinhos do público chamando para foto os famosos que passavam para lá e para cá.

A arena em questão foi a etapa nacional do Bocuse D’Or, dentro do Sirha Rio, feira de negócios francesa que aconteceu pela primeira vez no Brasil desde quarta-feira, 14. O encerramento culminou, nesta sexta, 17, na premiação de Giovanna Grossi, 23 anos, de Maceió (AL), como a candidata que representará o País na etapa latina, em 2016, desta que é considerada a Copa do Mundo da gastronomia. É a primeira vez que uma mulher é a campeã da edição brasileira.

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O chef Laurent Suaudeau e Giovanna Grossi, a primeira mulher a vencer a etapa nacional do Bocuse D’Or. FOTOS: Ana Paula Boni/Estadão

Para Laurent Suaudeau, presidente do Bocuse D’Or Brasil, que é realizado pela multinacional francesa GL Events, é um privilégio receber o Sirha no Brasil, mas o governo brasileiro deve investir mais na área. “Talvez o governo brasileiro venha a se tocar da importância de se investir na gastronomia. Infelizmente, o olhar das autoridades é de que isso é coisa de bacana. E não é. Está na hora de eles acordarem.”

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Durante dois dias, oito candidatos foram avaliados por um júri composto por dez dos maiores chefs do Brasil, entre eles Alex Atala, presidente do júri, e Roberta Sudbrack, recém-eleita a melhor chef mulher da América Latina no ranking do 50 Best.

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Jérôme Bocuse, presidente de honra do júri do Bocuse D’Or Brasil, o chef Claude Troisgros e Alex Atala, presidente do júri

Foram quatro candidatos por dia e, no primeiro dia, a participação do carioca Willians Halles, pupilo do francês Roland Villard, por exemplo, deu provas do clima de gincana. Sua torcida organizada gritava e aplaudia a cada passo que o cozinheiro finalizava seus pratos e os soltava para avaliação dos jurados. Com o tempo cronometrado e podendo ser penalizado por atrasos, Halles e seus adversários tentavam se concentrar em meio à balbúrdia da plateia, incitada por Guga Rocha, do programa Homens Gourmet (FOX Life).

A arquibancada, aliás, não deu conta do público que veio ver a competição, entre estudantes, cozinheiros, donos de restaurantes, gente da hotelaria e até chefs renomados, como o italiano Salvatore Loi. No primeiro dia, Loi assistia à competição ao lado do seu conterrâneo Luca Gozzani; no segundo dia, Loi estava na bancada de provas, como coach de Luiz Filipe de Azevedo, que foi seu sub-chef no Loi Ristorantino.

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Jérôme Bocuse, filho de Paul Bocuse, é tietado ao fim do primeiro dia de competição no Bocuse D’Or, no Sirha Rio

Entre os visitantes, muitos se aboletavam nas escadarias laterais para poder acompanhar a premiação. A organização do evento disse ter recebido mais de 9.000 visitantes nos três dias.

Além da etapa nacional do Bocuse D’Or e da Coupe du Monde de la Pâtisserie, que aconteceu na quarta-feira, o público circulava entre os cerca de cem estandes de empresas como Romani Salumeria (embutidos), Fazenda Camocim (cafés), Callebaut (chocolates), entre outras de louça, equipamentos e vestuário.

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Jurados em frente à numerosa plateia no Bocuse D’Or Brasil

A dinâmica da competição. Os oito candidatos (3 de São Paulo, 2 do Rio, 2 de Brasília e 1 de Maceió) foram selecionados às cegas a partir de receitas, uma de peixe e uma de carne, com dois ingredientes obrigatórios nos acompanhamentos: chuchu e ora-pro-nóbis. O peixe era pescadinha e a carne, miolo de alcatra.

Giovanna Grossi apresentou pescadinha com musse de beterraba, nhoque de chuchu, infusão de chuchu com gengibre e musse de milho. O prato de carne foi miolo de alcatra envolto em ora-pro-nóbis servido com arroz cremoso, esferificação de ora-pro-nóbis e mil-folhas com camadas gelatinosas de acerola e de Catupiry.

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Prato de peixe feito pelo carioca Willians Halles

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“Fiquei intimidada no começo porque todos os outros chefs são muito mais velhos, mas entrei no concurso de cara. Quis mostrar tudo o que eu sabia fazer e tudo o que eu gosto de fazer. E deu certo”, disse Giovanna logo após receber o prêmio, ainda aturdida com a notícia.

Giovanna, que se formou em gastronomia na Anhembi Morumbi e depois fez curso no Institut Paul Bocuse, ressalta a importância da cozinha francesa na sua formação. “Cozinha clássica francesa é a base de tudo. Se você não sabe a base, é difícil chegar em uma cozinha moderna como a da Espanha.”

Além de levar R$ 10 mil para casa, ela será treinada por Laurent em sua escola, em São Paulo, para as próximas etapas. Em fevereiro do ano que vem, ele disputa a etapa latina, no México. Dos 21 países que irão para a final na França, em 2017, apenas três da América Latina serão escolhidos; quem vencer em Lyon ganha 25 mil euros.

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“Quis mostrar tudo o que eu sabia fazer e tudo o que eu gosto de fazer. E deu certo”, disse a campeã Giovanna

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A importância do concurso. O Bocuse D’Or foi criado em 1987 pelo lendário chef Paul Bocuse, que completa 90 anos no próximo ano e detém três estrelas Michelin por ininterruptos 50 anos. A competição acontece de dois em dois anos em Lyon dentro do Sirha, que é presidido por seu filho, Jérôme Bocuse.

Para ele, que construiu sua carreira na cozinha nos Estados Unidos, o maior legado do pai é a congregação dos chefs numa classe para defender e divulgar a gastronomia. “Meu pai foi um dos primeiros a defender que os chefs saíssem da cozinha, conversassem com seus clientes, com a mídia. Isso foi há 50 anos. Mas hoje, se você perguntar ao meu pai o que os chefs deveriam fazer, ele iria dizer: ‘Voltem para a cozinha’. Tempos diferentes, discursos diferentes. Os chefs viraram celebridade demais”, disse ele, em entrevista ao Paladar.

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Jurados do Bocuse D’Or, Tsuyoshi Murakami, Emmanuel Bassoleil, Roberta Sudbrack e Didier Labbé recebem prato de um dos competidores

Na etapa brasileira, Jérôme veio como presidente de honra do júri, que, além de Alex Atala, teve quatro jurados para o prato de carne e quatro para o prato de peixe. Do lado do peixe, Roberta Sudbrack, Emmanuel Bassoleil, Tsuyoshi Murakami e Didier Labbé. Do lado da carne, Fred Frank, Pascal Jolly, Paolo Lavezzini e André Soares.

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Atala, que foi um dos candidatos da seletiva nacional em 1996, falou sobre a importância do Bocuse D’Or para o ramo. “Existe uma fascinação sobre a profissão de cozinheiro e existe um caminho que é este aqui, da competição, de mostrar desenvolvimento técnico e criatividade, que reflete o dia a dia da cozinha. Este evento valoriza não só a figura do chef, mas a profissão do cozinheiro.”

O francês Laurent Suaudeau, discípulo de Paul Bocuse e presidente do Bocuse D’Or Brasil, que acontece desde 1989

Assim como Laurent, Atala também criticou a falta de investimento do governo brasileiro na área. “O que o governo faz com a gastronomia é uma vergonha. O Brasil precisa acordar. Temos de valorizar nossos patrimônios, nossas diferentes cozinhas, a de luxo, a de rua, a regionalista, tudo. Nós precisamos olhar para dentro da gente.”

O segundo lugar ficou com Gabriel Daniel (de São Paulo, que ganhou R$ 6.000) e o terceiro, com Bruno Rappel (de Brasília, que levou R$ 3.000).

Os vencedores do Bocuse D’Or Brasil

* A repórter viajou a convite da GL Events, organizadora do Sirha

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