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Comida

Rumo ao Brasil profundo

Foto: Felipe Rau/AE

Rumo ao Brasil profundoFoto:

Foi uma edição em que o arroz o feijão e a farinha fizeram um banquete. O arroz virou carreteiro na cozinha de Helena Rizzo, galinhada nas mãos de Edinho Engel, fez par com a batata no prato de Carla Pernambuco. Arroz preto, branco, longo, agulhinha… e teve também o arroz vermelho servido com feijão-manteiguinha no PF sustentável feito por um cozinheiro preocupado com o meio ambiente e um ambientalista que sabe cozinhar.

No6.º Paladar – Cozinha do Brasil, muitos ingredientes tiveram papel de destaque, além da dupla arroz e feijão. Os peixes, as frutas, o café. Mas se houve um produto símbolo, talvez tenha sido a farinha. Ela, que dá liga à cozinha brasileira de Norte a Sul – como bem disse Rodrigo Oliveira, do Mocotó –, neste ano foi celebrada por diferentes cozinheiros. Farinha-d’água, farinha de açaí, farinha de bocaiuva, piracuí, farinha de Uarini (ovinha) e apareceu até a farinha de mandioquinha, descoberta de Oliveira.

Teve farofa de formiga – as içás que vieram do Vale do Paraíba no porta-malas do fusca de João Rural –, o tipiti que Thiago Castanho usa para fazer farinha lá em Belém e deu de presente para Oliveira – que, com o tal do tipiti acabou descobrindo a tal farinha de mandioquinha. Mas, mesmo conservando o frescor da novidade, a cozinha brasileira deixa cada vez mais de ser folclórica a nossos olhos. Está sendo tratada em sua complexidade cultural, suas técnicas e tradições, sua diversidade regional.

Durante três dias, o 6º Paladar – Cozinha do Brasil visitou nossa cozinha e foi ao Brasil profundo, mostrando diferentes regiões da terra e do mar, numa viagem em que ficou evidente que as relações entre produtores e cozinheiros estão cada vez mais próximas. Alex Atala trouxe seu peixeiro, Marcelo Nonaka, e seu fornecedor de pirarucu, seu Egiri. Rafael Costa e Silva apresentou Alexandre Nascimento, que cultiva produtos orgânicos na serra fluminense. Ana Trajano e Paulo Lima dividiram o palco com o produtor de azeite de Maria da Fé – que foi parar em diversas aulas, porque todo mundo ia ali pedir um pouco do azeite brasileiro.

A sustentabilidade também se instalou na cozinha. Edinho Engel e Juarez Campos deram trato aos peixes baratos, normalmente desprezados nas redes dos pescadores. Alex Atala ensinou a pescar, tirar a pele, preparar. Neide Rigo, Mara Salles e Ana Soares mostraram como aproveitar as frutas – das verdes às passadas.

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O evento cresceu – neste ano foram mais de cem horas de atividades, entre aulas, palestras, workshops, degustações. E se expandiu. Ultrapassou as fronteiras das salas de aula para proporcionar ao público atividades inéditas. De que outra maneira seria possível aprender a destrinchar porco no açougue da cozinha do novo restaurante de Jefferson Rueda que ainda nem abriu? Ou viajar a uma fazenda orgânica, com José Baratino como guia? E aprender a comprar peixe com Alberto Landgraf num passeio madrugada adentro pelo mercado de pescados da Ceagesp?

O Paladar – Cozinha do Brasil também foi parar em diversos restaurantes da cidade que fizeram menus especiais com temas do evento, em bares e na rede Suplicy de cafés especiais.

Mas o melhor, desta vez, guardamos para o final. O Paladar, que na edição de sexto aniversário, no ano passado, chamou a atenção para ingredientes, práticas e saberes tradicionais brasileiros ameaçados de extinção por serem considerados irregulares por órgãos governamentais, promoveu, na noite do domingo, um encontro entre chefs, produtores e pesquisadores e a Anvisa, representada pelo assessor da presidência Norberto Rech, a gerente-geral de alimentos, Denise Resende, e a especialista em regulamentação Lígia Schreiner. O objetivo: apresentar à Agência Nacional de Vigilância Sanitária as demandas específicas daqueles que querem trabalhar com as tradições da culinária brasileira.

O debate foi regado a galinha ao molho pardo, queijos de leite cru, goiabada de tacho de cobre e mel de abelhas nativas (todos irregulares, porém deliciosos). E terminou com promessa dos dois lados: chefs vão se articular para organizar as demandas, Anvisa vai avaliar os casos que competem a ela e ajudar a criar diálogo semelhante com o Ministério da Agricultura.

Uma conversa, enfim, como deve ser. Em torno da mesa

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