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Restaurantes e Bares

Com açúcar, afeto e garra: brasileiro vira chef confeiteiro de restaurante badalado de NY

Ele chegou a Nova York aos 8 anos, como imigrante, e foi morar no Queens. Não tinha boas notas nem dinheiro para fazer faculdade. Hoje, comanda a cozinha de pâtisserie de um badalado restaurante no Meatpacking District

Com açúcar, afeto e garra: brasileiro vira chef confeiteiro de restaurante badalado de NYFoto:

De Nova York

“Vamos conhecer a Disney?”, convidou a mãe de Thiago Silva, quando ele tinha oito anos e vivia em Goiânia, no Centro-Oeste. Ela, ele e a irmã arrumaram as malas e partiram para os EUA. Mas o destino era outro: o bairro do Queens, em Nova York, que concentra imigrantes de todo o mundo. Eles nunca mais voltaram para Goiás.

Vinte e dois anos se passaram e agora é possível achar Thiago em outro canto da cidade, Manhattan, onde é chef de pâtisserie de um imenso e bem cotado restaurante, o Catch. Também está na TV: semana passada, ele venceu um reality show de cozinha, o programa Chopped. Teve de cozinhar para jurados como a chef confeiteira do Momofuku, Christina Tosi, e levou a melhor contra três concorrentes.

Thiago Silva. Aos 30 anos, é chef-pâtissier, assina o menu de sobremesas e comanda a equipe de confeitaria do badalado restaurante Catch, no Meatpacking District, em Manhattan, NY. FOTOS: FOTOS: Júlia Rettmann/Estadão

Thiago não deixou o Queens, onde ainda mora, mas é no Meatpacking District, bairro de bacanas e turistas, que dá expediente e se faz conhecer no ultracompetitivo meio gastronômico nova-iorquino. Em 2013, foi apontado pelo guia Zagat como um dos 30 mais inovadores e talentosos profissionais da gastronomia abaixo de 30 anos. Volta e meia, aprece em revistas e é jurado de prêmios.

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No Catch, restaurante com 260 lugares, comanda uma equipe de sete funcionários. O cardápio com sete sobremesas leva sua assinatura. A mais popular é uma pequena torre com sorvete e brownie, encimada por uma espécie de ‘eskibon’. Uma vez quebrada a casca desse eskibon um creme de baunilha se espalha sobre o bolo e o sorvete. Mas isso não resume o repertório de Thiago: ele serve também um delicado sorbet com bolo de coco, manga e yuzu (fruta cítrica japonesa), entre outras criações. E faz alguns bolos extravagantes sob medida e por encomenda para celebridades. Já fez bolo em forma de piano de cauda para o cantor John Legend, uma garrafa de champanhe num balde de gelo comestível para a atriz Sofia Vergara, uma bola de basquete doce para o astro do New York Knicks Carmelo Anthony.

Criação. Custard com sorvete de praliné, farofa, passas ao rum e caramelo

Os donos do Catch têm um grupo, chamado EMM, que investe em restaurantes e bares – e tem acesso ao circuito americano das celebridades, promovendo eventos e festas. Por conta disso, famosos como Robert De Niro e Kanye West já provaram as sobremesas de Thiago no Catch. Mas ele não se deslumbra com as celebridades. “A única vez que realmente fiquei maluco foi quando fiz um bolo para o Derek Jeter”, conta o chef, com leve sotaque americano. Ele se refere a um dos maiores jogadores da história do beisebol, ídolo dos Yankees, time de Thiago. “Dá um Google da festa de 40 anos dele e você vai ver lá meu bolo”, diz, empolgado, sobre o doce em forma de rolo de cinema com cenas da carreira do jogador e que teria custado US$ 1.600.

Thiago virou referência no curioso nicho dos bolos extravagantes para celebridades por acaso: “Ouvi os patrões dizendo que precisavam encomendar um bolo para uma festa e me ofereci para fazer. Mas nunca tinha feito. Errei muito e botei dinheiro do bolso na primeira vez, até acertar”, conta Thiago, que nunca estudou formalmente confeitaria.

Donut Apple Pie

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Na prática. Entre a vida de criança imigrante no Queens e o sucesso atual, Thiago passou por momentos difíceis. Completou o high school público, mas como não tinha boas notas, nem tentou entrar em faculdade. Chegou a visitar a prestigiosa escola de cozinha International Culinary Center (ICC, antes chamado French Culinary Institute), mas o curso é caro e ele acabou aprendendo na prática, entre estágios e bicos nos restaurantes.

Thiago conta que, desde criança, se encantava pelo mundo da cozinha. A mãe fazia bolos à brasileira por encomenda e ele a ajudava, e o padrasto era garçom em um restaurante.

No começo, teve ajuda do C-Cap, ONG que dá oportunidades em cozinhas profissionais para jovens desfavorecidos (e para a qual doou os US$ 10 mil que ganhou no reality show que venceu). Num dos seus primeiros trabalhos, foi parar no setor de pâtisserie de um restaurante chamado Olives e percebeu que aquela seria sua faculdade. “Comecei a pesquisar bastante em livros, TV, internet. Acho que para provar para os outros e para mim que mesmo sem estudar, eu poderia ser um bom profissional.” Hoje, conta com orgulho sobre quando foi chamado para ser jurado em concurso no mesmo ICC que visitou aos 17 anos e que não pôde frequentar.

Prêmios. Ganhou, na semana passada, o reality show Chopped. Em 2013, foi apontado pelo guia Zagat como um dos mais inovadores e talentosos profissionais da cozinha dos EUA com menos de 30 anos. E ainda faz bolos extravagantes para festas de famosos.

Thiago passou ainda por outros restaurantes e uma padaria antes de quase desistir da profissão. “Foi na crise econômica, de 2008 para 2009. Estava desempregado, tinha 25 anos. As entrevistas de emprego sempre tinham enormes filas na porta, eu era considerado qualificado demais para trabalhos mais simples, ou pouco qualificado para ser chef”, diz. Thiago é religioso e frequenta a igreja Luz Para o Mundo, no Queens. “Naquele momento falei para Deus: vou desistir, largar tudo. Só que aí apareceu uma chance.” Ele conseguiu um emprego no grupo EMM como ajudante de cozinha, posto abaixo, na hierarquia da cozinha, do que já tinha alcançado na carreira.

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Em três meses, já tinha virado sous-chef de pâtisserie e, aí, começou a fazer bolos. Dois anos depois, já era o chef-executivo e montou do zero toda a parte de sobremesas do Catch.

Hoje, ele é motivo de orgulho na comunidade evangélica brasileira nova-iorquina Luz Para o Mundo. É casado com uma brasileira imigrante, Caroline, com quem tem um filho, James. “No dia do prêmio do Zagat a gente tocou o sino de abertura da bolsa da Nasdaq, saiu na TV. Já imaginou? Minha mãe e minha esposa me vendo na TV, por causa do meu trabalho!”

Um de seus sonhos, agora, é voltar para Goiás para matar a saudade do churrasco e andar descalço na rua – e conhecer seus irmãos por parte de pai. “Mas acho que só para visitar. Sou brasileiro, se tiver de voltar para lá, volto. Só que minha vida foi feita aqui, na América.”

Torre de sorvete e brownie…

No topo, um bloco com casca de chocolate…

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Quando se quebra a casca de chocolate com a colher…

O creme de baunilha se esparrama pelo prato.

 SERVIÇO – CatchNona Avenida, 21, Nova York Tel.: 1-212- 392-5978 Site: emmgrp.com/restaurants/catch

>>Veja a íntegra da edição do Paladar de 30/4/2015

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