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A identidade, de novo

Lembrei de uma conversa com o crítico espanhol Rafael Garcia Santos, na ocasião em que ele esteve por aqui. O homem estava indignado: "Onde está a cozinha brasileira aqui em São Paulo? Só vejo restaurantes italianos, franceses, ou alguns imitando os novos espanhóis". Expliquei a ele que a cozinha brasileira seguia em busca de sua gastronomia. Que tínhamos já restaurantes que trilhavam este caminho, usando produtos regionais, partindo da tradição e modernizando-a ou, no mínimo, buscando a melhor representação de alguns pratos típicos. Enfim, como dizem hoje alguns técnicos de futebol, era um processo. Mas disse também que o caso de São Paulo era particular. Trata-se de uma cidade de imigração recente, com hábitos e informações diferentes de outras capitais. Contei como a cidade crescera nos últimos cem anos, como recebeu diversos povos, coisa e tal. E disse a ele que isto também era uma identidade. Que eu - como tantos outros paulistanos - havia crescido comendo em casa lasanha, feijoada, bacalhau, dobradinha... E nisto não via conflito. Era a comida da família, eram as receitas que as pessoas praticavam naquele universo. E que eu era tão brasileiro quanto alguém que vivia na Amazônia ou no Cerrado. Só que o crítico Garcia Santos achava que aquilo era, sim, falta de identidade. "Aqui, os restaurantes estrangeiros são maioria. Como pode?". Respondi que, de certa forma, eu também achava interessante andar por Donostia e ver, nas ruas, nas esquinas, basicamente restaurantes bascos. E que sonhava com um futuro onde os restaurantes brasileiros fossem bem mais numerosos em SP. Mas que nossa identidade - a paulistana, ao menos - estava ali: botecos com pratos-feitos, virados, macarronadas; pizzarias; restaurantes japoneses. Isto não é de mentira, é a expressão legítima de um estilo de vida, de uma organização social. Nem sei se Garcia Santos se convenceu. Mas eu continuo concordando com o que expliquei a ele - isso faz mais de um ano, e eu poderia ter mudado, também. Como dizia o genial editor Murilo Felisberto, eu não sou escravo das minhas opiniões.

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