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O real e o irreal

Está nos principais veículos de comunicação, é uma efeméride importante. O Estado, por exemplo, traz um belo material na seção de Economia. Estou falando dos 20 anos do Plano Real ? que, independentemente de orientações políticas, foi um marco civilizatório no País. Nem vou entrar em questões estruturais, que não são a minha praia. Vou falar aqui de gostos, de futilidades. Mas quero lembrar de um momento muito especial para quem, naquela época, já se divertia com comida e bebida: o início dos anos 90. No atrapalhado governo Collor, veio a abertura do mercado para importados. No início do Plano Real, institui-se o câmbio um para um, o dólar valendo tanto quanto a moeda nacional. Foi uma festa. Foi um prazer, foi didático. Deu para provar muita coisa nova, experimentar ingredientes, arriscar um monte de vinhos e outros produtos ? ouso dizer que muitos aficionados se formaram naquela naquela fase. Eu me recordo, particularmente, de um vinho do qual eu gostava muito, o Conde de Valdemar Crianza, produzido na Rioja. Era, então, o "meu vinho", dava para consumir quase que cotidianamente. O preço? Acho (e acho mesmo, pois não encontrei catálogos antigos nem comprovantes) que custava US$ 16. Imaginem, um belo vinho que se comprava por R$ 16 (ok, faz tempo; mas era bom negócio). Olhando para trás, para além das cifras saudosas e amigáveis, tenho uma sensação, com esses produtos, vinhos em particular, de que o mais interessante é que eles não mudavam muito de patamar, em relação ao país de origem. Vou explicar. Um vinho médio lá na Europa, mal e mal, era um vinho médio aqui. Um artigo de primeira linha, no Hemisfério Norte, também o era nas nossas gôndolas. Sei que os impostos sobre bebidas são absurdos, os entraves e as burocracias são kafkianos; e tem o lucro da importadora, tem a parte do restaurante etc? Mas o fato ? para resumir a história ? é que me incomoda muito, hoje, ver que um vinho de, digamos 5 euros, portanto simples, cotidiano, acaba sendo vendido em nosso país como um exemplar caro. E constatar que aquilo que, lá na França ou na Itália, é um tinto ou branco ordinário, ganhará aqui um status muito maior. Muda-se o patamar do produto e, no fim, pagamos caro por algo que nem de longe vale o que se cobra. Não dá para sonhar de novo com o ?um para um?, é claro. Aquilo foi circunstancial, estratégico. E, convenhamos, a estabilidade nacional é mais importante do que o apetite por alimentos finos. Mas dá para pensar, quem sabe num ambiente menos hostil ao empreendedorismo, que talvez a gente não precisasse pagar 6X por uma garrafa que, na ponta inicial, custa X. Mas daria para ambicionar, por exemplo, que conseguíssemos pagar pelos vinhos do Chile (nosso quase vizinho, embora sem fronteiras) aquilo que os ingleses pagam (lá, tão mais longe, custa menos). Concluindo, então: entre 1994 e 1999, o câmbio era irreal. Mas os preços da comida e da bebida que vinham do exterior, por outro lado, pareciam mais perto do real.  Sem ou com trocadilho, fica a gosto do freguês. (Ah, sim, o Conde de Valdemar. Continua no mercado, trazido pela Mistral. O Crianza custa pouco mais de R$ 90?).

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