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O senhor das mollejas

Estou falando de Luís Acuña, o chef parrilheiro do El Pobre Luís, em Buenos Aires. Ele é o personagem do título do post. Acabo de saber de sua morte, ainda sem muitos detalhes. Foi no sábado, ao que parece um problema súbito, um ataque fulminante. Acuña, grande conhecedor de carnes e de técnicas, era um cozinheiro dos mais estimados no meio. Em mais de uma ocasião ele participou do Paladar - Cozinha do Brasil, cuidando do churrasco de domingo (era então uma tradição no evento). Nascido no Uruguai, açougueiro de formação, Acuña foi para a Argentina nos anos 70, e por lá ficou. Seu restaurante, em Belgrano, é um porto seguro da boa carne, de apetitosas pamplonas. Mas, para mim, será sempre o endereço das melhores mollejas grelhadas que já comi. Segundo meu amigo Diego Man, muito próximo de Acuña, não era de hoje que o médico pedia moderação. Menos estresse e comida, mais esporte, eram as recomendações. "Imagine você que o médico está me mandando andar a pé. Depois de tantos anos de trabalho, agora que eu consegui comprar um Land Rover, ele quer que eu deixe o carro em casa", dizia o chef, com seu bom humor característico. Lembro particularmente de uma noite muito fria em Buenos Aires, zero grau. Eu havia acabado de chegar na cidade com minha mulher e minha filha. Um bom voo, até o momento de descobrir que a TAM simplesmente... não sabia onde estava nossa bagagem. Depois de muita conversa, e promessas de rastreamento, restou-nos ir para o hotel, com a roupa do corpo (e com algumas peças que minha mulher trazia na bolsa). Não sabíamos o que aconteceria, se passaríamos frio à noite, se as malas seriam encontradas. Até queresolvemos deixar para trás, ao menos por um tempo, o azedume e a apreensão. Pegamos um táxi e fomos para o Pobre Luís. O acolhimento do simpático Acuña, o ambiente animadamente caótico, com todas aquelas camisas de futebol, as mollejas, as pamplonas... E, de repente, todos os contratempos pareciam superados. Decidimos que deixaríamos os problemas para o próximo dia. Pois uma porção de mollejas já havia salvo a nossa viagem. O chef conhecia o produto como ninguém ("pego apenas as mollejas grandes, perto do coração, não as que ficam perto da traqueia; deixo-as bem limpas; e grelho com muito cuidado, pois precisam ficar leves, úmidas", ele explicava). As bagagens? Foram encontradas num outro país sulamericano e, na manhã seguinte, foram entregues no hotel. Mas será triste voltar à Calle Arribeños 2393 sabendo que ele não estará lá... Torço para que seu filho leve o legado adiante.

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