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Tenro. E bem cozido, por favor

Jornal velho vai para a feira, embrulhar peixe, banana etc. Mas notícias que dão o que comentar ficam. No mundo online, então, os critérios sobre o que é descartável, o que é permanente, são ainda mais elásticos. E, embora tenha sido tema principal da seção de Negócios do Estadão na semana passada, eu quero voltar a um assunto que me interessa particularmente. O destaque estava no fato de a Barilla, gigante das massas secas, potência industrial da região de Parma, se adaptar, pela primeira vez, a um apetite local específico. Eles, que sempre fabricaram pasta asciuta com trigo de grano duro, vão agora produzir macarrão de grano tenero, para o gosto brasileiro (e com matéria-prima brasileira). As razões empresariais, os números, estão muito bem explicados aqui. Porém, o que me chama atenção é a estatística de consumo nacional. Com seus spaghetti, fusilli e afins feitos à moda italiana, os donos da Barilla disputam apenas 3% do mercado brasileiro de massas secas. Pois nada menos do que 97% dos consumidores gostam mesmo é da pasta de grano tenero, que fica mais molinha... É interessante lembrar que, na Itália, a matéria-prima tida como padrão de qualidade para a pasta asciuta é o trigo de grano duro. O tenero é mais para a massa fresca, pães etc. Por aqui, foi o inverso. Sempre tivemos à mão o grão tenero. E foi a partir dele que os imigrantes italianos reconstruíram algumas de suas tradições, em especial em São Paulo. As massas made in Italy de grano duro, por sua vez, só chegaram aqui para valer nos anos 90, depois da abertura para as importações. E, desde então, vêm disputando uma fatia restrita que, segundo a reportagem, é de 3%. Na minha função, tenho que defender aquilo que considero gastronomicamente correto, elegante, digestivo (e gostoso: eu prefiro mesmo o al dente). Mais e mais, a cocção firme, sutilmente resistente à mordida, vem de fato se estabelecendo nos restaurantes mais fieis à cucina, seja clássica ou moderna. E, no entanto, em casa, na macarronada de domingo, a grandíssima maioria quer mesmo a massa bem cozida. É bom não esquecer, por outro lado, que a pasta asciuta al dente, na própria Itália, não é antiga como a dinastia Médici. É uma invenção mais do século 20. Algo que sempre foi um tanto mais natural no Sul, e que demorou para pegar no Norte. Mas que tomou a dimensão de verdade gastronômica especialmente por força da atuação de figuras como o cuoco Gualtiero Marchesi. O assunto rende, enfim. E, só para esclarecer, a Barilla não vai abandonar a turma dos 3%, segue nesse mercado. Mas foi disputar os 97% com Renata, Adria e outros que nadam de braçada no segmento...

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