Mês de junho na Europa, as vacas felizes começam a subir a montanha para curtir o verão e os produtores aproveitam para fazer os queijos mais apreciados do ano. Isto porque a enorme biodiversidades dos "pastos de alpage", as montanhas que no inverno ficam embaixo da neve, renasce em uma multitude de florzinhas e forrageiras de todas as cores no verão. As vacas alucinam e a nova alimentação faz toda diferença na cor, sabor e aroma do leite e do queijo.
E depois de alguns meses confinada, fui eu, tão feliz como uma vaquinha que sai dos galpões invernais em direção ao pasto das altas montanhas, fazer uma viagem de 15 dias para investigar porque tem havido na França uma baixa enorme na produção do leite de montanha no último século, para um dossiê especial da revista Profession Fromager, onde trabalho na França, que será publicado na íntegra no Brasil em outubro, na revista franco brasileira Profissão Queijeira. Algumas regiões, como o Pirineus, entre 2008 e 2014 perdeu 15% do volume.
Com o jornalista especializado em queijo Arnaud Sperat Czar (e meu marido), percorremos 3 mil km de paisagens lindas e comemos muitos queijos nobres das regiões da Auvergne, Franche-Comté, Savoie e Vosges na França e no Cantão de Friburgo, na Suíça francesa. Vou dedicar os próximos 12 posts do nosso blog a um fotodiário de bordo da viagem, com muitas fatias de queijo, cultura e história.
Nossa primeira parada foi na região da Auvergne, no maciço central da França. A Auvergne parece Minas Gerais, com seus pequenos montes vulcânicos no maciço central da França. Dentre as várias cooperativas da região, a Cooperativa Leiteira de Paulhac é instalada em maior altitude, 1.117 metros!
"Nós percebemos que os produtores de leite de montanha estavam desmotivados com o preço do leite vendido a indústrias que pasteurizam. Então resolvemos motiva-los a participar de um programa para melhorar a qualidade do leite para que ele possa ser transformado cru em queijo cantal DOP, o que valoriza a matéria prima em 20 a 30% a mais" disse Gilles Dechambre, responsável técnico da queijaria.
Na prática, ao todo 20 produtores aderiram a novas práticas, como não dar alimentos fermentados para os animais e monitorar a qualidade da água dos pontos de bebedouro das vacas, para que o leite cru possa ter maior qualidade microbiológica.
O programa está em andamento, mas por enquanto a cooperativa transforma o leite pasteurizado. Com 40 kg cada peça, ele é vendido com o mínimo de 4 semanas de maturação feita por curadores profissionais da região. Mas os mais apreciados são os de dez a doze meses.
A fabricação do cantal prevê uma massa esmigalhada que passa por uma dupla fermentação. No caso da cooperativa, devido ao volume, o processo é feito em uma máquina de moer os grãos.
A prensa bem forte é responsável em seguida por unir os grãos salgados, que já passaram por duas fermentações, em um cilindro de 40 cm de diâmetro e 40 cm de altura, formato final do queijo.
Com o passar do tempo de cura, a casca fica com uma textura de pequenos botões amontoadinhos, o aroma da massa é animal, se dissolve lentamente na boca... e nesse momento maravilhoso você sente a intensidade do queijo em todos os seus poros! Eu gosto de acompanhar o cantal com um vinho do Porto Tawny, mais claro e com sabor de frutas secas, que sublima força animal do queijo.
No próximo post, visitamos uma fazenda que fabrica queijo cantal e salers com leite cru produzido no local, outra realidade e outros sabores...