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Bebida

Dize-me o que diz teu rótulo e eu te direi que vinho és

'Se soubessem o que há numa garrafa de US$ 8, talvez os consumidores entendessem as diferenças de preço’

Franqueza. Uvas – e ácido tartárico, levedura, lascas… Graham conta tudo. FOTO: Tony Cenicola/NYTFoto:

Do New York Times

Lembram daquele vinicultor que tentou revolucionar os centenários rótulos dos vinhos? Seu nome é Randall Graham, proprietário da Bonny Doon Vineyard. Cinco anos atrás, Graham deu o ousado passo de listar em suas garrafas todos os ingredientes que entravam no vinho. Os riscos da inovação eram muitos. A começar de que ninguém gosta de ver o romantismo da bebida quebrado por ingredientes como ácido tartárico, dióxido sulfúrico e lascas de carvalho.

Graham talvez esperasse aplausos pela transparência, mas o que viu foi só indiferença. “Achei que haveria algum impacto, uma mudança de atitude, o início de uma discussão, mas a maioria nem sequer notou”, queixou-se ele.

Franqueza. Uvas – e ácido tartárico, levedura, lascas… Graham conta tudo. FOTO: Tony Cenicola/NYT 

Permita-me então, Graham, agradecer em nome de um público que gostaria de ver mais produtores com sua coragem. Sou um inveterado leitor de rótulos e fanático por vinhos. Quero saber não só quais são os ingredientes básicos da minha bebida, mas todos os outros insumos. Por isso, fiquei fascinado pelos rótulos da Bonny Doon.

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Infelizmente, só uns poucos produtores seguiram o exemplo. Um desses bravos foi a Shinn Estate Vineyards, de North Fork, Long Island. “Li sobre o que ele estava fazendo e entendi como transparência e honestidade são importantes”, diz David Page, dono da Shinn.

Mas outros podem aderir à tendência. A Ridge Vineyards pôs informações sobre os ingredientes da safra 2010 em seu site e vai pôr nas garrafas as informações sobre os vinhos 2011, informou Paul Draper, principal executivo da Ridge. Draper revelou que nos anos 1980 ele mesmo tentou listar nos rótulos os ingredientes dos vinhos, mas o governo disse que não era permitido.

Não é surpresa que a grande maioria dos vinicultores não queira ver documentado o que há em suas garrafas. Mas para Graham e Page, que tentam fazer seus vinhos com o mínimo de intervenção, a lista de ingredientes é um compromisso de responsabilidade – e um guia do que deve e não deve entrar no vinho. “Às vezes leio num rótulo ‘ácido tartárico’ Precisa ter ácido tartárico?’”, pergunta Page.

Ele e Graham foram fisgados pela filosofia dos biodinâmicos, que prega um ecossistema estável na vinícola e o equilíbrio entre açúcar e ácido nas uvas. Mas os dois também são vinicultores pragmáticos, que admitem um mínimo de “invasão”para melhorar os vinhos. “Porém fico mal com isso, e a transparência remedia”, diz Graham.

Ajustar a acidez ou usar um pouco de levedura são das intervenções mais suaves na vinificação. Vinícolas industriais, e mesmo algumas que se dizem artesanais, manipulam muito mais seus vinhos, e preferem que ninguém saiba quanto. Qual delas gostaria de informar que põe concentrados de uva como Mega Purple ou Ultra Red para escurecer ou encorpar vinhos? Ou que usa o conservante Velcorin?

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Mas, tornando transparentes os ingredientes e os métodos, os vinicultores podem dar início a um diálogo educativo, começando com a pequena porcentagem de consumidores que se liga no que dizem os rótulos. “Acho que os consumidores entenderiam as diferenças de preço entre vinhos se soubessem o que há numa garrafa de US$ 8”, diz Page.

Eu, por mais que goste de ver tudo nos rótulos, não sou favorável a uma lei que obrigue. Prefiro deixar a cada um adecisão de rotular, com a esperança de que mais e mais produtores venham a aderir. Com o tempo, talvez fique claro quem tem e quem não tem alguma coisa a esconder.

Veja todos os textos publicados na edição de 11/10/12do Paladar 

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