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Bebida

Famoso enólogo francês vai fazer vinho no Brasil

Célebre por seus espumantes, Peterlongo contrata Pascal Marty, que tem no currículo Mouton Rothschild e Almaviva, para desenvolver linha de tintos e brancos sem borbulhas

O francês Pascal Marty (à esq.) e Luiz Carlos Sella, da Peterlongo, que farão vinhos juntos. Foto: Jeferson Soldi|DivulgaçãoFoto: Jeferson Soldi|Divulgação

Aos 57 anos, o enólogo e produtor francês Pascal Marty participou da criação de alguns dos vinhos mais emblemáticos do mundo, a começar pelo californiano Opus One, fruto da histórica parceria entre o Barão Philippe de Rothschild, do Mouton Rothschild, e o norte-americano Robert Mondavi, que colocou os vinhos de seu país no mapa do mundo. 

Como enólogo e cogerente de projeto, Marty também liderou o lançamento do ícone chileno Almaviva, parceria do Mouton com a gigante Concha Y Toro, operação que o levou a fincar sua base no Chile, onde reside há 20 anos. Não satisfeito, em 2003 aceitou o convite da Cousiño Macul, uma das mais tradicionais do Chile, para criar o Lota, vinho que celebrou os 150 anos de sua fundação.

O francês Pascal Marty (à esq.) e Luiz Carlos Sella, da Peterlongo, que farão vinhos juntos Foto: Jeferson Soldi|Divulgação

Desde 2008, além de prestar algumas consultorias, ele também administra sua própria vinícola, a Viña Marty, cujos vinhos são distribuídos no Brasil pela importadora Del Maipo.

A partir de agora, Marty terá que incluir o Brasil, mais precisamente a Serra Gaúcha, no roteiro de suas viagens, pois acaba de se tornar consultor da Peterlongo, fundada em 1915 pelo imigrante italiano Manoel Peterlongo. O convite partiu de Luiz Carlos Sella, o empresário gaúcho da indústria de pneus que há 14 anos comprou a vinícola dos herdeiros da Peterlongo. E que, depois de saneá-la financeiramente e de revitalizar sua tradicional linha de espumantes, pretende agora, com a ajuda de Marty, ampliar a produção de vinhos tranquilos, hoje inexpressiva. A razão, segundo Sella, é que esses últimos respondem por 80% do total do mercado contra 20% dos espumantes.

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O convite foi formalizado por ocasião da recente Avaliação Nacional de Vinhos, ocorrida no dia 24 de setembro, em Bento Gonçalves, da qual Marty participou como comentarista. Foi lá que ele e Sella conversaram sobre essa nova parceria. 

O contrato tem prazo de dez anos ou, como observou o bem-humorado Marty, “até que a morte nos separe”. Ele será consultor exclusivo da Peterlongo no Brasil e, embora o foco seja a produção de vinhos tranquilos, abrangerá também a área de espumantes. 

Curiosamente, caberá a um francês, ainda que natural de Perpignan (“sou catalão”), colaborar com aquela que é, provavelmente, a única empresa produtora de espumantes no mundo legalmente autorizada a usar o termo Champagne em seus rótulos, ainda que não possa exportá-los.

Abaixo o enólogo francês fala sobre a nova parceria com a vinícola brasileira.

O sr. já participou de grandes projetos. O que o atraiu à Peterlongo? Há tempos venho observando e degustando vinhos brasileiros. Hoje, para mim, não existe nenhum país que não seja capaz de produzir bons vinhos (Entre outros países, Marty já fez consultoria no Japão e na China). O que me atrai no Brasil e especificamente nesta zona é a dificuldade que o clima representa. Para fazer grandes vinhos, sempre é preciso estar em condições difíceis. A natureza ajuda, mas também é preciso lutar contra ela. E todos os vinhos feitos em condições não tão favoráveis têm mais elegância e fineza. E isso é algo que me atrai. Moro há 20 anos no Chile, mas continuo francês e um grande aficionado dos vinhos de Bordeaux e da França em geral. Nos vinhos daqui encontro características mais parecidas com as da Europa do que as do Chile. Quais seriam essas características? Elegância, taninos macios, caráter mineral e grau alcoólico baixo.Prefere fazer vinhos varietais ou de corte?  Prefiro os de corte, porque um Cabernet Sauvignon é sempre um Cabernet Sauvignon. É difícil diferenciar e dar alma a um vinho varietal. O corte é uma forma de imprimir marca ao vinho. Como avalia o potencial das variedades da Serra Gaúcha?  Há muitas variedades e grande potencial. Os tintos me surpreenderam bastante. Não imaginava que se pudesse fazer vinhos tão elegantes e tão bem definidos. O que prova que aqui há profissionais que realmente sabem fazer vinhos muito bons. O que talvez falte é encontrar uma identidade para os vinhos brasileiros. A Cabernet Sauvignon é algo que se encontra basicamente na Califórnia; o Malbec, na Argentina; o Tannat, no Uruguai; e o Carmenère no Chile. Todavia não entendo o estilo do vinho brasileiro. Os vinhos são bons, mas para realmente levar uma bandeira adiante precisa ter uma imagem, uma alma, e é esta alma que não encontro. Não encontro isso no Cabernet Sauvignon porque, se é para fazer vinhos ao estilo de Bordeaux, a luta vai ser muito difícil. Tampouco a direção será a de fazer vinhos como os chilenos ou argentinos. Por isso, creio bastante nos vinhos de corte. São os que permitem fazer vinhos que sejam representativos da casa e da família, porque isso também faz parte do terroir.Já pensou em algum corte? A Cabernet Sauvignon entraria? Tenho ideias, mas não estou seguro. A CS é uma cepa que ajuda num corte, mas não sou fanático por ela pura. Diria até que me esses vinhos me aborrecem porque são monolíticos, unidimensionais, lhes falta alguma coisa.  O que já provou aqui de outras variedades? Provamos vinhos de Touriga Nacional, Teroldego, Ancellotta. São vinhos talvez um pouco mais rústicos mas que quando entram num corte se complementam bem. E essa rusticidade pode ser compensada com variedades como a Merlot ou a Cabernet Franc. É preciso avaliar o potencial de algumas variedades, como envelhecem, como se comportam e se completam umas com as outras. O que é mais importante neste ofício? É preciso ter humildade. Somos parte de uma vitivinicultura em crescimento no Brasil. O mais importante é partir da base, que é o vinhedo. Sem boas uvas nem mesmo o melhor enólogo do mundo vai fazer bons vinhos.  Mas quando o dono de uma vinícola como a Peterlongo contrata um enólogo que trabalhou 14 anos no Mouton Rothschild a expectativa não é fazer um Mouton Rothschild brasileiro? Já conversamos sobre isso. O château Mouton Rothschild levou 200 anos para ser o que é. 

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