PUBLICIDADE

Comida

Águas turvas, ostras claras

Por Daniel Telles MarquesEspecial para o Estado

Águas turvas, ostras clarasFoto:

Em uma das muitas braças da Bacia do Iguape, os quilombolas descobriram as ostras nascidas e crescidas nas águas marrom-avermelhadas do Rio Paraguaçu. Presas às raízes das árvores que cresciam nos leitos, as ostras eram extraídas para consumo próprio e para alguns poucos desbravadores do Recôncavo Baiano. Mas passaram a ser exploradas comercialmente para o sustento dos quilombolas. “Olha como ela é doce e suave, não tem aquela coisa marinha das outras”, empolga-se Alício Charoth. “E olha essa bitola. Nunca vi ostras tão grandes.”

Nico é o responsável pela produção comercial das ostras dos quilombos Kaonge e Dendê, é ele quem cata os crustáceos quinzenalmente para levar de ônibus a alguns restaurantes em Salvador. “Tem dias que me pedem mais, mas eu não tenho.” Remando sozinho, singra o rio, cuidando para desviar das estacas fincadas na lama para reter as redes onde as ostras ganham corpo.

LEIA MAISCAPA + Vestígios da comida que veio da África + Os focos da resistência

‘Bitola’. O pesquisador Alício Charoth diz que nunca viu ostras tão grandes como as produzidas nos criadouros dos quilombos Kaonge e Dendê no Recôncavo Baiano; o produto abastece alguns restaurantes em Salvador

Com técnicos da Embrapa aprendeu que pedaços de garrafas PET são os berçários ideais para segurar as cascas das ostrinhas que irão para as moquecas preparadas por mãe Juvani para quem visita o quilombo. Ao ver um siri em uma das estacas, pega o remo e o afasta. “Eles quebram as cascas e comem as ostras”, diz. Da canoa, Nico tem o privilégio de conhecer o sabor da ostra no seu ápice do frescor. Do rio para a ponta da faca, da concha para a boca. Limão? “Não, prefiro assim, só com a água do rio”. Quando tem fome e falta combustível para os remos, lá se vão algumas ostras goela abaixo. Ao ouvir a história das 150 ostras comidas por Brillat-Savarin, largou um sorriso assustado e um “oxi, oxi, oxi”.

PUBLICIDADE

Na última festa da ostra, no final de setembro, o rapaz colheu algumas centenas delas para atender aos apetites vorazes de quem foi ao quilombo. E não houve monotonia no preparo, algumas ostras foram assadas, outras, cozidas e fritas por mãe Juvani. “Catei umas ostras bem pequenininhas, botei no sol para secar com pimenta e cominho e fritei. Aí ficou uma delícia e o povo gritava: ‘Ô, mãe, faz mais assim, faz mais assim’. Mas cadê ostra pra mais?”, diz a cozinheira.

SERVIÇO | Ajeúm da DiásporaOnde: R. Amparo do Tororó, 157, TororóTel.: (71) 8843-2230Quando: Apenas aos domingos, a partir das 12h. Somente com reserva. Não aceita cartões

SERVIÇO | Dona Mariquita – RestauranteOnde: R. do Meio, 178, Rio VermelhoTel.: (71) 3334-6947

SERVIÇO | É de OxumOnde: Quilombo Kaonge, IguapeTel.: (71) 9923-0116 (falar com Ananias Viana)

>>Veja a íntegra da edição do Paladar de 20/11/2014

PUBLICIDADE

PUBLICIDADE