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Comida

De galocha pela madrugada

Bastidores da visita à Ceagesp (Foto: Ezyê Moleda)

De galocha pela madrugadaFoto:

1h – Na porta do Grand Hyatt, o chef Alberto Landgraf, do Epice, espera os participantes do passeio com um sorrisão na cara e um amontoado de sacolas plásticas na mão. “Galocha se usa com sacola, não meia.” O motivo é mais físico do que higiênico: a sacola ajuda o pé a deslizar para dentro da bota.

2h – Já no mercado, a primeira parada – não podia ser diferente – é na tradicional sopa de cebola. Ali, Landgraf fala sobre a cadeia de pescados no Brasil. “Do mar à mesa, o peixe passa por seis mãos.” A Ceagesp é a terceira parada e, a partir dali, tudo é tributado. Calcule os lucros de todos: por isso o produto chega caro. Ele sublinha alguns pontos: como quase todas as bancas têm as mesmas variedades; como não há dinheiro nas transações, tudo é anotado e o cliente paga depois; como a manipulação é feita sem cuidado. Pondera que o peixe no Brasil precisa avançar no que diz respeito ao manuseio e diz que a Ceagesp é boa para restaurantes – embora ele mesmo não compre lá –, não para compradores individuais. O grupo chia. Então o que estamos fazendo aqui? Landgraf lembra que, além de saber escolher, é preciso entender como o produto chega ao mercado. O amadurecimento do consumidor passa por conhecer a origem e os caminhos daquilo que come. O grupo quer saber, então, afinal, onde é melhor comprar pescados? “O melhor peixe que você vai achar no Brasil é o peixe da feira”, diz o chef. “É sempre melhor comprar com a pessoa em quem você confia.” É hora, então, de entrar no mercado e ver de onde vem o peixe.

2h30 – Na lenta caminhada até o interior do mercado, mais explicações sobre o funcionamento do lugar. Compra-se a caixa do peixe. Cada uma tem 20 quilos. E todas têm os peixes mais bonitos à vista, para esconder os feinhos. O chef explica que muitas vezes o cliente não pode nem mexer na caixa, tem de olhar, apostar e levar. Escolhidos os produtos, o peixeiro anota o total da compra e o carregador coloca a compra no carrinho. Na Ceagesp não entram caixas de fora. E as dali não podem sair. Os carregadores as levam até a porta e, de lá em diante, o comprador que se encarregue de transportar o pescado.

3h10 – Mal sobem a rampa de acesso e os visitantes já param. Diante da primeira caixa de peixe, querem saber se aqueles ali estão frescos e o que devem fazer para escolher bem. O chef aponta os olhos (devem estar límpidos), a pele (precisa estar brilhante, “glossy”) e as guelras (devem estar vermelhas).

3h15 – Lá dentro, todos se concentram em torno dos atuns. Eles têm, grudado à pele, um papel com uma tripa avermelhada. É um pedaço da carne, para que se possa ver a cor do peixe por dentro. E é este pedaço o parâmetro de compra. “Se você chega ao restaurante, abre o peixe e ele está clarinho, o prejuízo é seu”, explica o chef, contando que, para fazer sushi, a carne de atum mais escura é considerada mais nobre.

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3h30 – Diante de uma caixa de camarões, o grupo quer aprender a escolher. Landgraf pega o crustáceo pela cabeça e mostra que, se o corpo ceder à gravidade, é porque está velho. Se ficar empinado, ou seja, se a curva do corpo for mantida, pode comprar. Ao lado dos camarões, há uma caixa com polvos. E todos, claro, querem saber selecionar o mais fresco. Landgraf pergunta o preço e o peixeiro diz: R$ 8 o quilo. Ele responde: “Está barato demais, não vale a pena nem ver. Quando um produto está com o preço muito abaixo do de costume, eu não compro”. E qual é o preço normal? Uns R$ 15 o quilo.

3h45 – E a lula? Basta ver se a pele está lisa e sem gosma. Landgraf convida cada um a deslizar o dedo sobre a pele do molusco para conferir a textura de uma lula fresca.

4h – Já na saída, o grupo topa com lagostas. Como escolher? Landgraf segura o bicho pelo corpo, de modo que a cauda forme um ângulo e exponha a carne. “Se estiver escura, está velha. A carne precisa estar durinha, olha só, põe o dedo.”

4h05 – É aí que aparece Wagner, o peixeiro de Landgraf. Ele não atende mais na Ceagesp. Abriu uma empresa para fornecer pescado diretamente aos restaurantes, embora continue frequentando o mercado para comprar peixes para sua empresa. Ele diz que também trabalha com fornecedores diretos, que mandam o pescado até de avião. “Mexo com isso porque eu gosto. Amo peixe”, declara Wagner, no grand finale da visita.

4h15 – A caminhada até a saída é pontuada por mais explicações sobre a tal logística das caixas. O grupo se aproxima do lugar no qual os carregadores as levam, ainda cheias. Lá na porta, o conteúdo é transferido para o recipiente levado pelo comprador. As caixas de cada banca são postas numa pilha e, depois de lavadas, recolhidas.

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4h50 – Depois de 13 km percorridos em silêncio numa van sonolenta, o grupo desembarca na recepção do Grand Hyatt. Cansados, é verdade, mas muito animados. E o mais animado parecia ser o chef, que tinha de correr pra casa, para acordar cedo, fazer as malas, ir ao Paladar – Cozinha do Brasil dar sua aula de Peixes e Cítricos para, depois, embarcar para a Dinamarca – onde participaria do congresso MAD FoodCamp, organizado por René Redzepi (Noma).

Ceagesp – Av. Dr, Gastão Vidigal, 1.946, V. Leopoldina, 3643-3700

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