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Comida

Do Delmonico’s para o Divino: ovos benedict

por J. A. Dias Lopes


Eggs Benedict do Diner 210, de Benny Novak (Felipe Rau/AE)Foto:
Eggs Benedict do Diner 210, de Benny Novak (Felipe Rau/AE) 

Cozinheira de mão cheia, a personagem Nina/Rita (Débora Falabella) alavanca a audiência da novela Avenida Brasil, da Rede Globo, com seu desempenho brilhante, sede de vingança contra a vilã Carminha (Adriana Esteves) e pratos apetitosos que prepara na casa do ex-jogador de futebol Tufão (Murilo Benício). Dias atrás fez um clássico internacional do brunch: ovos benedict.

Muitos dos espectadores de Avenida Brasil passaram a semana nas redes sociais trocando variações da receita. Segundo a tradição, os ovos benedict – duas fatias ligeiramente torradas de muffin (às vezes trocadas por pão de fôrma), cada uma com uma lâmina de presunto, um ovo cozido na água, com a gema mole, molho holandês e uma lasca de trufa preta – foram criados no Delmonico’s de Nova York, que abriu em 1831 e fechou 107 anos depois.

Primeiro grande restaurante dos EUA, em sua cozinha de influência francesa surgiram receitas antológicas: camarões newburg (em molho cremoso), batatas delmonico (com manteiga e suco de limão), chicken à la king (cortes desossados de frango em molho à la creme e ninhos de massa folhada) e sierra nevada (biscoito com sorvete e merengue dourado no forno).

Todas homenagearam clientes. Os ovos benedict, por exemplo, surgiram a pedido do enjoado casal homônimo. No final do século 19, eles entraram no restaurante e desafiaram o maître: “Você não tem nada de diferente para nos sugerir?” O maître foi para a cozinha e voltou com os ovos benedict.

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Mas a receita de elaboração mais atribulada do Delmonico’s foram os camarões newburg. Frequentador assíduo, Ben Wenberg, oficial da Marinha dos Estados Unidos, apareceu contando que havia saboreado em um concorrente “a melhor receita de lagosta do mundo”. O dono do Delmonico’s, seu amigo, mandou a cozinha testá-la. Quando ficou pronta, deu razão ao cliente, mandando incluí-la no cardápio com o nome de lagosta à wenberg.

Tempos depois, eles brigaram e romperam para sempre. O dono proibiu Wenberg de voltar ao Delmonico’s e ordenou à cozinha que parasse de fazer o prato. Mas todos continuavam pedindo. Pressionado, o dono recolocou o prato no menu, mas inverteu as letras: virou lagosta newberg. Charles Ranhofer, o francês que chefiou a cozinha do restaurante de 1862 a 1876 e de 1879 a 1896, completou a transformação. Começou a preparar a receita com camarão e denominá-la newburg.

Até hoje nenhum restaurante dos EUA superou o Delmonico’s em glamour. A casa introduziu no país o luxo e o conforto do salão, serviço à la carte, carta de vinhos; ensinou a elite a comer berinjela, endívia e muitas novidades. Referimo-nos ao restaurante pioneiro, fundado pelos irmãos John e Peter Delmonico, depois comandado pelo sobrinho Lorenzo, que acabou se estabelecendo na 2 South William Street, onde permaneceu 80 anos.

Deliciaram-se com sua comida os presidentes Abraham Lincoln e Theodore Roosevelt, os milionários William Waldorf Astor e Cornelius Vanderbilt, os escritores Charles Dickens, Oscar Wilde e Mark Twain, que escolheu o Delmonico’s para festejar seus 70 anos de vida. Até Napoleão III esteve no restaurante, antes de ser coroado imperador da França.

“Cear no Delmonico’s era um prazer gustativo (e caro), e uma experiência sumamente teatral”, afirmam Randi Danforth, Peter Feierabend e Gary Chassman, no livro Estados Unidos – Um Descobrimento Culinário (Könemann, 1999), que dedica duas páginas à casa. “Sua decoração era opulenta, com candelabros, mármores e belos artesanatos de madeira”. Será que Tufão, nascido e criado no Divino, ia se sentir bem ali?

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