PUBLICIDADE

Comida

Só pode o zum-zum

A abelha faz zum-zum e mel. Só que a legislação vigente no Brasil não leva em conta esse fato, pelo menos para as abelhas nativas, pelo menos por enquanto. Das centenas de espécies nativas, algumas sem ferrão, as chamadas Meliponinae, produzem mel muito saboroso e diverso. Na semana passada, a colunista do Paladar Neide Rigo contou como extrair o mel da jataí em casa e deu ideias de como usá-lo.


Ilustração: Farrell/AEFoto:

De fato, nos supermercados não se achará à venda o produto, pois o mel de abelhas nativas não atende aos padrões de umidade e concentração de açúcar que têm como referência o mel da Apis mellifera, espécie europeia (aquela listrada de amarelo e preto). Portanto, não é configurado como mel e não pode ser comercializado, a não ser que seja desidratado.

O problema do reconhecimento parece estar com os dias contados. O projeto da nova lei de produtos de origem animal (Riispoa), do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), contempla enfim o mel de abelhas nativas. Só que a discussão não acaba aí. Segundo José da Cunha, presidente da Confederação Brasileira de Apicultura, há cerca de 350 mil apicultores e meliponicultores no País, dos quais 85% são agricultores familiares.

Ilustração: Farrell/AE 

E o novo regulamento em discussão faz exigências técnicas que preocupam essa maioria que cultiva tanto a Apis quanto as abelhas sem ferrão.” O pequeno produtor não tem como investir R$ 50 mil para construir uma estrutura que atenda às normas”, diz. A CBA enviou na última semana reivindicações ao ministério.

O ecólogo Jerônimo Villas-Bôas, autor do Manual Tecnológico: Mel de Abelhas sem Ferrão, saúda o prometido reconhecimento do mel nativo. “Mas não basta reconhecer e legislar. É preciso fomentar”, diz Jerônimo, que ressalta a necessidade de entender o mel como produto de uma cadeia complexa de agricultura familiar e de reconhecer métodos tradicionais de trabalhá-lo. “Cada arranjo produtivo – tradicional, indígena, quilombola – é de um jeito. Claro que deve atender a padrão de higiene. Mas o problema é que o ministério entende esse padrão de uma forma asséptica inviável.”

PUBLICIDADE

Como o Riispoa é um regulamento geral, o que preocupa Jerônimo é se os instrumentos normativos específicos, a serem editados depois, vão ter compreensão ampla sobre o mel de abelhas sem ferrão. E se haverá abertura por parte do Mapa para ouvir os pequenos produtores. De acordo com Ricardo Camargo, da Embrapa, que coordena a Câmara Setorial do mel na discussão do novo Riispoa no ministério, os pequenos produtores serão escutados. Ele lembra que o Riispoa abarca várias cadeias produtivas, e os Regulamentos Técnicos de Qualidade específicos de cada setor é que vão, na prática, disciplinar a produção e comercialização dos produtos. “Estamos numa fase de transição geral de ter que mudar o Riispoa e revitalizar os regulamentos. É um desafio”, diz.

Segundo Camargo, as principais demandas dos pequenos produtores são o reconhecimento de pequenas unidades de extração, às vezes montadas no quintal de casa, e a caracterização do mel extraído como matéria-prima, portanto, livre de inspeção antes de ser beneficiado em entreposto – como é praxe no mundo todo. Quanto ao mel de abelhas nativas, que por ser mais úmido é mais suscetível à proliferação microbiana, Camargo sugere a redução do prazo de validade para viabilizá-lo comercialmente.

PUBLICIDADE

PUBLICIDADE